terça-feira, agosto 30, 2005

Gato por lebre, ou o caso TVI

Muito se vem falando do caso da venda a uma empresa espanhola de uma participação importante do capital da TVI e, ao mesmo tempo, da prorrogação das licenças de emissão dos operadores privados por mais 15 anos.
Conheço razoavelmente o enquadramento da questão, até porque, conjuntamente com Proença de Carvalho, Carlos Barbosa, Maria Elisa e Nuno Sintra Torres, fui um quatro subscritores do Projecto TV1, que se apresentou a concurso, em 1991, para a concessão de 2 novos canais de televisão privada, projecto esse que foi vencido, em benefício dos projectos SIC e TVI.
Nos termos da Lei, a Alta Autoridade para a Comunicação Social pronunciou-se, então, sobre os projectos, considerando que todos eles reuniam os requisitos mínimos necessários e que tinham a ver com a programação, tempos de emissão, origem dos programas, nacional ou estrangeira, cobertura do território, meios técnicos, equilíbrio financeiro e outros.
Será curioso recordar que, na sua apreciação, a AACS considerou o projecto da TVI, entre os três, como o “projecto mais modesto, quantitativamente moderado e qualitativamente menos exigente, em que a predominância da defesa dos valores do humanismo cristão influencia coerentemente o conteúdo e o estilo dos programas”.
Embora esta característica da programação não contasse da Resolução referente à concessão, ninguém duvidou de que a atribuição da licença teve tudo a ver com o facto de serem Instituições ligadas à Igreja Católica o seu principal promotor e os garantes do perfil da programação.
Passados alguns, poucos, anos os accionistas promotores da TVI, face à fragilidade financeira revelada, foram obrigados a encontrar novos accionistas. Mercê de sucessivos processos de reconstituição do capital, os accionistas fundadores vieram a dar lugar a outros accionistas que em nada participaram no projecto da fundação.
Como resultado, da TVI apenas ficou o nome, porquanto a linha de programação foi totalmente alterada, face aos novos objectivos traçados para a empresa.
A nova linha de programação em nada passou a corresponder àquele que esteve na base da concessão da licença.
Face a tão completa transformação, o facto seria, na opinião de muitos, motivo suficiente para a cessação da licença de emissão.
Não me lembro de alguém, na altura, pedir a cessação da mesma, com base em que o projecto nada tinha a ver com o que foi licenciado.
No meio da turbulência gerada com a venda aos espanhóis, foi, agora, suscitada a questão da renovação da licença por mais 15 anos.
É óbvio que tal teria que acontecer.
Terminando as actuais licenças em 2007, ninguém iria investir com o horizonte temporal de 2 anos e, para mais, sabendo que o tipo de emissão em nada se identificava com o que tinha sido proposto.
Do meu ponto de vista, e mais até do que a questão da nacionalidade do capital, interessará saber qual o perfil de programação que estará na base das novas licenças e como é que elas serão acompanhadas.
Pois, se tal não acontecer, estar-se-á, novamente, a licenciar lebre e a servir-se gato.

in 4R

Excelente post

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