sexta-feira, agosto 19, 2005

Factura de Junho a 21 por cento

PT Comunicações cobrou IVA à taxa errada
17.08.2005 - 10h39 Maria Lopes PÚBLICO

A Portugal Telecom (PT) Comunicações cobrou, em Julho, planos de preços utilizados pelos utentes em Junho com a taxa de IVA já a 21 por cento, em vez dos 19 por cento em vigor na data de realização das chamadas. De acordo com as indicações dos Serviços do IVA, a cobrança de um serviço continuado, como é o caso de uma assinatura, deve ser feita à taxa em vigor no momento da sua utilização e não consoante a data da sua facturação.

Um ofício-circular dos Serviços do IVA datado de 24 de Junho sobre a alteração da taxa, estipula que, no caso das "prestações de serviços de carácter continuado", como é o caso das assinaturas mensais - da linha telefónica ou de serviços como os planos de preços - e de outros alugueres, a "alteração da taxa apenas se aplica às operações realizadas a partir de 1 de Julho de 2005" (quando aumentou, de facto, a taxa máxima do imposto). E exemplifica: "Se houver uma facturação em 16/7/2005 que englobe operações de carácter continuado que tiverem lugar antes e depois de 1/7/2005, as efectuadas em data anterior serão tributadas à taxa de 19 por cento e as efectuadas a partir de 1/7/2005 (inclusive) serão tributadas à taxa de 21 por cento". Em factura emitida a 9 de Julho pela PT Comunicações (serviço fixo), os planos de preços - que permitem aos clientes falar durante um período de tempo a uma taxa reduzida ou sem que lhe seja cobrado mais nada além do preço do plano -, ainda que digam respeito ao período entre 4 de Junho e 4 de Julho, aparecem com o valor totalmente associado à nova taxa do IVA, 21 por cento. O correcto seria a parte correspondente aos dias de Junho ser taxado a 19 e os restantes quatro dias a 21 por cento. Fonte da PT afirmou ao PÚBLICO que esses planos de preços se referem ao mês de Julho - pagos, portanto, por antecipação, tal como a assinatura mensal - mesmo que na factura tenham uma data diferente. No mesmo documento, as comunicações fora dos planos de preços têm o IVA a 19 por cento por este ser cobrado à data da realização da chamada, diz a PT. De acordo com o especialista em Direito Tributário Tiago Caiado Guerreiro, esta é uma situação em que nitidamente se está a infringir a lei. Mas, salienta, "por vezes o enquadramento e a aplicação das normas no IVA não são fáceis". Seja porque "as normas são, nalguns casos, muito gerais", porque "é uma taxa que se aplica a todos os bens excepto os excluídos, o que leva a que nem sempre seja fácil enquadrar um certo produto ou tipo de serviço", ou até mesmo devido à falta de informação por parte dos serviços centrais. Os problemas no enquadramento da legislação do IVA podem fazer com que uma empresa não possa, por vezes, deduzir o imposto, o que irá pesar na sua contabilidade "numa altura já crítica para as empresas portuguesas", diz o jurista, que não tem dúvidas de que a subida de impostos, e em especial do IVA, é uma das razões fundamentais para a deslocalização das empresas portuguesas para Espanha.

Falta de informação

As facturas da PT Comunicações não são as únicas onde se podem encontrar ilegalidades. Uma rápida busca pela carteira deixa a descoberto outro problema comum nos recibos que diariamente o consumidor final recebe: a falta de informação da taxa que está a ser cobrada ao cliente, quer seja a sua percentagem, quer o montante que será entregue ao Estado como imposto. Os exemplos são vários: o parque de estacionamento do município lisboeta não especifica qual a taxa de IVA que cobra aos seus clientes, dizendo apenas "IVA incluído". Tal como uma camisola comprada nos armazéns El Corte Inglés, em cujo verso do recibo diz IVA incluído e na parte da frente, entre as várias parcelas e alguns códigos, se vislumbra um "C21" perdido, sem qualquer outra referência, montante correspondente ou percentagem a acompanhar. Quem entrar em Portugal e precisar de abastecer o depósito na área de serviço do Fundão, na A23, não saberá qual o IVA que está a pagar sobre o combustível: a factura da Propel, em espanhol, limita-se a dizer que tem o "IVA incluído à taxa em vigor". A Brisa, concessionária de auto-estradas, opta por dizer aos clientes que o preço que acaba de pagar tem "IVA incluído à taxa normal". Se do ponto de vista do consumidor isso não é esclarecedor - menos ainda se se tratar de turistas estrangeiros aos quais é possível, à saída do país, receber o valor do imposto pago - a verdade é que, segundo o jurista, tal informação não infringe a lei. O Código do IVA lista os bens e serviços que são sujeitos, respectivamente, a taxa reduzida e intermédia. O que significa que todos os que não constem de tais listas pertencem à categoria de taxa normal. As empresas continuam a prevaricar neste tipo de casos porque, considera Tiago Caiado Guerreiro, as punições praticamente não existem. As infracções aparecem sobretudo em recibos fornecidos aos consumidores finais que, apesar de pedirem factura, não as usam para deduzir o IVA na sua contabilidade - até porque na maioria dos casos não servem para a dedução especial em sede de IRS, introduzida há dois anos. Estas falhas parecem, no entanto, escapar aos olhos do consumidor, já que a associação de defesa do consumidor (Deco) diz que não tem registo de queixas por causa da cobrança indevida do imposto nem as queixas por causa de falhas na informação disponível nos recibos são significativas. No caso das relações entre empresas, estas são "mais atentas" e por isso há menos infracções. Mesmo assim, as facturas incorrectas fazem com que a empresa que pagou o bem ou serviço não possa deduzir o imposto e a empresa que passou a factura arrisca-se a uma contra-ordenação.

in O Público 17 Agosto 2005

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